segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Breve Guia Rodoviário Mesa 42 - parte I

Como é tradição, nas vésperas das comemorações natalinas esta Mesa dá um tempo à poluição e à balbúrdia paulistanas, levanta acampamento e se instala em terras d'além-Mantiqueira. Esse ano, cumprindo seu papel cívico, vem publicar breves relatos para orientação àqueles que pretendem comer asfalto por nossas estradas em grande parte das vezes tão largadas.

A começar pela BR-381/Rodovia Fernão Dias. Embora a cobrança de pedágio só tenha se iniciado em duas praças próximas à Região Metropolitana de Belo Horizonte (km 659 e km 546), as intervenções estão em andamento ao longo de todo o trecho Sampa-BH. E aí a porca torce o rabo.

Nos pontos em que segue a construção das outras praças, o trânsito se dá em apenas uma faixa nos dois sentidos. A primeira dessas obras está em Vargem/SP, a 7 km da divisa com Minas. No último sábado, levava-se às 6 da manhã mais de 45 minutos para percorrer parcos 4 km. De vez em quando, à margem da fila rastejante, uns carros abalroados momentos antes ou outros com o capô levantado a mostrar uma fumacinha oriunda do sistema de arrefecimento. Esposas preocupadas, crianças brincando, adolescentes emburrados, cães empolgados com o mato.

As obras das praças de Cambuí (km 902), São Gonçalo do Sapucaí (km 804), Carmo da Cachoeira (km 733) e Carmópolis de Minas (km 596) também causaram congestionamentos, mas de impacto menos incisivo que o de Vargem. O atraso total da viagem foi de aproximadamente 1h30min, o que não é muito frente a alguns eventos registrados em meu histórico.

Em toda a extensão, a condição do pavimento é boa em geral. Havia trechos muito esburacados, notadamente o paulista, primeiro a ser duplicado e que muito antes do previsto se deteriorou bastante - não sei por que. Mas já começou a execução do método da mais alta tecnologia brasileira de manutenção rodoviária, o tapa-buracos. Há segmentos em que estão refazendo o revestimento. Em ambos os casos, o trânsito se dá em uma única faixa, o que faz a velocidade média despencar. Antes isso, porém, a não conservar coisa alguma.

A imprensa belorizontina noticiava até semana passada que o trecho de pior condição em Minas era exatamente o situado entre as praças de pedágio que já estão a cobrar. Tiveram a pachorra de contar o número de buracos. No sábado poucos não estavam cobertos, mas como aqui os céus estão a se desfazer em águas, e o tráfego de caminhões é intenso, suspeito que esse band-aid não vai durar nada.

Por falar nas chuvas, o rio Paraopeba, que fez bastante estrago por aqui nos dias anteriores, felizmente não impedia a passagem pela ponte entre São Joaquim de Bicas e Betim, embora ainda se mostrasse cheio demais da conta.

Notei a retirada de poucas placas, a sinalização está boa. Ela foi toda refeita durante as intermináveis obras de duplicação realizadas pelo Governo Federal desde a década de 90 e estava bem mantida, a exceção de uma placa ou outra amassada ou danificada pelo fogo - tá, o trecho paulista, que ficou pronto primeiro, já estava bem capenga. Na listagem de obras e melhorias previstas pela concessionária e disponíveis na internet, nada relativo a sinalização é discriminado - óbvio, nós já bancamos. De fato não teríamos como usar a via sem sinalização adequada, foi necessário. Mas é questionável o Governo primeiro gastar horrores com as obras de recuperação - de má qualidade - primeiro arcar com as pelancas e os ossos e depois conceder o filé mignon da exploração.

Ainda não houve tempo de instalarem telefones de apoio ao usuário, mas ao longo da estrada há divulgação do 0800. O site da concessionária ainda é muito simples e não informa as condições de segurança ao longo da via, fica então o serviço de utilidade pública desta Mesa.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Nossas casas

Tristeza vermos nossas casas entregues aos ratos. Lá crescemos, tivemos formação, acolhedoras, umas dadivosas por natureza, outras orgulhosos de seu zelo bastante confundido com rigor arcaico, são tantas, e todas elas perdem seu viço paulatinamente, um ruir quase em surdina. Triste, porque nelas ainda habitam quem poderia manter sua fortaleza, alguns chegam mesmo a se mobilizar, teimam, mas a cegueira - ou a indiferença - de muitos são o combustível mais potente dos que as assolam com sua mesquinhez. Triste, porque há quem aponte o caminho correto, e são palavras ao vento, sua resistência é pífia ante a inércia gigantesca.

Ah, a família? Uai, graças a Deus, vai muito bem, obrigado.

Voltemos, pois, às casas.

Mesmo sabendo que elas, infelizmente, permanecerão entregues aos ratos.

domingo, 30 de novembro de 2008

Ocasião ou afinidade

Outro dia um aluno veio me consultar sobre a situação do mercado de trabalho para o engenheiro recém-formado que quer se manter fiel à causa e não ceder às tentações para atuar no setor financeiro. Dúvidas de quem assistiu no início do ano a uma grande procura por profissionais de Engenharia no mercado e está para entrar na etapa final do curso, pensando no estágio já como uma garantia de trabalho ao fim da faculdade. "Fico no banco onde sei que vou garantir um salário bacana ou largo tudo e vou para uma empresa de projeto?" A questão é mais velha que andar pra frente e ainda hoje martela na cabeça dos graduandos com bastante freqüência.

Quando eu cursava meu primeiro ano da graduação, alguns professores do curso me disseram que apenas 20% dos engenheiros formados nas últimas turmas trabalhavam na área de Engenharia. Dos 80% restantes, a maioria estava empregada na área financeira. Era uma época pouco promissora para os engenheiros. A economia, apesar do recente Plano Real, em amarga recessão, o governo promovendo corte de investimentos em infra-estrutura - pois, no julgamento de alguns partidos políticos, eram gastos públicos - num país em que o maior cliente, o dono dos maiores projetos de Engenharia é o Estado. Com cada vez menos projetos de grande vulto, as empresas de Engenharia, que tiveram seu apogeu no governo militar, ofereciam escassas vagas e por salários achatadíssimos.

E os motivos que levavam a área financeira receber os engenheiros de braços abertos eram conhecidos e publicados em reportagens sobre mercado de trabalho: raciocínio lógico, facilidade de abstração e de sistematização dos problemas, familiaridade com a matemática, etc etc etc. Talvez por isso a procura pelos cursos de Engenharia tenha resistido ao período de vacas magras.

Numa das empresas em que fiz estágio, um engenheiro com mais tempo de janela do que eu de vida comentou certa vez que, do jeito que a Engenharia andava em baixa, e com o país necessitando cada vez mais de infra-estrutura, veríamos um dia as empresas trazerem engenheiros do estrangeiro para suprir as vagas abertas por falta de profissionais no mercado. O tempo voou e ano passado vivemos a euforia do PAC, dos indicadores sócio-econômicos favoráveis, o país transformado em um grande canteiro de obras. Da noite para o dia, as empresas de Engenharia saíram à cata de profissionais. Os bons tempos da Engenharia voltaram!, ouvi de alguns. Corriam relatos de que várias delas adotaram como alternativa trazer funcionários de seus escritórios no exterior. Por quê? Onde estavam os engenheiros? Boa parte no mercado financeiro, e muitos dos que se propunham a preencher essas vagas não tinham boa formação técnica segundo os avaliadores. Curiosamente, no entanto, não vi comentarem algo que ainda era um problema, os salários oferecidos, que apesar da substancial melhora, continuavam desinteressantes frente às objetáveis condições de trabalho que os engenheiros sabem vigorar no ambiente corporativo.

Quem estabelece diretrizes na vida apenas no sentido de ganhar o máximo de dinheiro possível tem como problema nessa vã tarefa identificar corretamente a "crista da onda", quando ela vem, de que direção virá, ou seja, qual o caminho mais fácil a se percorrer. Encerramos 2008 com uma pulga atrás da orelha sobre até que ponto o festejado desempenho econômico do país será prejudicado pela retração da economia de alguns dos nossos primos ricos. Continuará chovendo na horta do engenheiro?

A economia tem altos e baixos, e assim também é nosso mercado de trabalho. Particularmente acho muito arriscado a gente se orientar por sombra de avião, mudanças sempre ocorrem, e temos de estar bem preparados para quando elas chegarem. Uma boa formação é um dos pontos que nos auxilia. E, convenhamos, nas instituições de ensino de excelência não são poucos os apertos, sobram perrengues, mesmo fazendo o curso do qual gostamos. O que não deve ser passar esses apertos num curso que não nos seduz em nada?

Expliquei todos esses parágrafos há uns dias para outro aluno, de início de curso, que estava inseguro sobre por qual dos cursos da área de Eng. Civil optar lá na faculdade no fim deste semestre. Pergunta básica: "Você sente que tem mais afinidade com qual dos dois cursos?". Recebi um balde de água gelada: "Na verdade com nenhum deles, eu queria mesmo era ser administrador, meu sonho é atuar no mercado financeiro, mas entrei na Engenharia porque meu pai exigiu, disse que era a forma mais garantida de eu trabalhar no que eu queria. Então, professor, o que me aconselha?"

Garçom, por favor traz mais uma no capricho, que essa conversa ainda vai rolar por muitos, muitos anos ainda...

domingo, 9 de novembro de 2008

Tarefas gostosas... mas e tempo pra elas?

Esta minha geração, coitada, tá danada. A despeito dos tão festejados indicadores de aquecimento da economia nacional - sim, até a crise chega com atraso por aqui - uma parcela considerável de meus contemporâneos ainda corta um dobrado para conseguir emprego, em geral por conta da má qualificação - o crescente degringolar da educação e de nossos educandos é assunto pra outro post. Ao mesmo tempo, quem está empregado sofre com a famosa "correria", falta de tempo, excesso de trabalho, estresse, estafa, seja por não se encontrarem profissionais gabaritados para contratação, seja por abuso do empregador, ou mesmo por efeito desse discurso falacioso de que o homem moderno não pode perder tempo e outras bobagens similares que se tornaram dogma.

É sobre uma das perdas impostas aos pertencentes a esse segundo grupo, os "fagocitados pelo sistema", que quero falar rapidamente. É um luxo hoje o cidadão poder, no horário do almoço, ir em casa fazer sua refeição, preparada do jeitinho que ele gosta, sem falar da economia que isso proporciona. Se isso já está ficando difícil, raríssimos são os que reservam um tempinho para se aventurar na cozinha.

Não sou bom cozinheiro, meu referencial é muito viesado, minha mãe é ótima cozinheira, minha avó cozinhava bem, tias idem, meu pai também não faz feio - quem mandou vir ao mundo no seio de uma típica família mineira. Mas eu me arrisco na cozinha, e gosto. Reconheço que não vou além do trivialíssimo - ah, sim, em Minas couve se inclui no trivialíssimo - até porque não sou aficcionado por pratos requintados, um mexidão* bem feito já me aguça o apetite. Mas há aqueles dias em que a inspiração, para o bem ou para o mal, te sugere umas estripulias. Raras vezes, por exemplo, me propus a cozinhar feijão, com resultados que em nada apeteceram. Em compensação me dá prazer descobrir um truque novo num prato absolutamente corriqueiro, como um tempero diferente, uma combinação inédita ou em proporção mais ousada.

Infelizmente é só nos finais de semana que consigo tempo para pilotar o fogão. E hoje, enquanto picava a cebola, relembrei de como preparar a comida é uma boa higiene mental. Descascar, cortar, picar, ralar, socar, dosar, misturar, você pratica a matemática e a coordenação motora enquanto se distrai. E evita a comida de plástico dos shoppings abarrotados aos domingos. É claro que cozinhar para uma família imensa diariamente é tarefa pesada, mas não é o caso de quem mora sozinho, ou apenas com a(o) esposa(o).

São hábitos que nos fazem bem, mas que, por não combinarem com a pressa crônica de nossa época, são abandonados. Dia desses vi um documentário sobre quituteiras do interior do país, como é assustadora a nós, que por pressa usamos microondas para esquentar um copo d'água, a paciência que elas dedicam àquele momento, ciosas de que cada etapa exige seu tempo certo, a colher de pau mexendo em lentas rpm, arte aprendida e aperfeiçoada ao longo da vida.

Algumas tarefas que nos fazem bem exigem tempo. A natureza, em vários de seus processos úteis ao Homem, da mesma forma o exige. É um aprendizado que teimamos em jogar fora mas que, me incluo na lista, precisamos revalorizar.

(*) Em família, é também chamado de mexidinho. Aos que não conhecem essa iguaria, descrevo-a com as palavras do viajante inglês Richard Burton, que a experimentou de passagem por Lagoa Dourada em 1867 e registrou em seu livro: "é a denominação burlesca de um prato (composto de) carne, arroz, feijão, farinha e outras coisas, tudo misturado e comido com colher". Deve ser a mais antiga referência bibliográfica sobre o mexidão.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Se é assim em nossa democracia, assim será

Dia desses vasculhei minha pequena bagunça em busca de comprovantes de votação e ou justificativa dos últimos dois pleitos para solicitar um documento. Achei-os junto com canhotos de votações ainda mais antigas, e me dei conta da baixa freqüência com que, de fato, votei em um candidato nos últimos anos.

Eu me mudei para a capital de São Paulo há quase doze anos. No início, como meu vínculo com a cidade era quase nulo, ao passo que minhas relações sociais ainda aconteciam preponderantemente do lado de lá da Mantiqueira e do Paraíba do Sul, sempre me envolvia muito mais com processos eleitorais de lá do que com os daqui. O vínculo crescente com São Paulo foi me despertando interesse pelas decisões políticas desta cidade. Contribuía para isso, confesso, o péssimo nível dos candidatos à prefeitura lá da terrinha. Não obstante a roubalheira explícita de alguns que por lá passaram, a cidade chegou mesmo a eleger um deles sob a vergonhosa e esfarrapda desculpa do "rouba, mas faz".

Acabei, assim, sem escolher um prefeito durante toda essa fase paulista, teclar na urna eletrônica só nas eleições para presidente e governador, nas quais quase sempre fiz questão de comparecer. E enquanto meu interesse pela política municipal da terrinha minguava, sempre demonstrava simpatia por algum candidato em São Paulo.

Ano passado, finalmente, transferi para cá meu título - e agora com RG e CNH emitidos aqui, foi inevitável me tornar cidadão paulistano, mas o "uai" faço questão de manter! - e estrearia justamente numa eleição municipal. Hoje nas duas cidades houve segundo turno. Tanto lá como aqui o debate teve seu foco mudado das questões essenciais para a desmoralização pessoal. Aqui nenhum dos postulantes me seduziu em absolutamente nada, o que venceu não penso que vá trazer nada do que a cidade efetivamente necessita, e a que perdeu eu tenho dúvidas de que viesse a fazer tão melhor. Lá, no entanto, pela primeira vez, vi despontar um nome a quem valia a pena dar uma chance, concorrendo com um nome conhecido, cuja gestão anterior não deu nenhuma feliz lembrança para o cidadão que se importa com a evolução da cidade.

Infelizmente, não creio que a terrinha terá do que se orgulhar nos próximos quatro anos. Verdade que meu voto lá não alteraria o resultado, da mesma forma que aqui esse ano ele de nada valeu. Isso não me incomoda, não encaro eleição como jogo do bicho ou da loteria. O que me frustra de fato é ver aqui uma perda de tempo e energia imensa, na campanha e no porvir, e lá um indigesto retrocesso cujo preço eu torço para que não seja muito alto.

Daqui a dois anos tem mais.

sábado, 25 de outubro de 2008

Da reabertura desta mesa

E após 3 anos de ostracismo, esta mesa retorna à atividade.